terça-feira, 6 de maio de 2008

Show em Serra Talhada – Finalmente perdi a virgindade!

Olá pessoal.

Calma. Não é nada disso que estão pensando. Apenas aconteceu uma coisa neste show que nunca tinha feito, mas desejava um dia fazer. Somente isso!

Fui convidado por meu amigo Normando para substituí-lo no monitor de um artista daqui de Recife chamado André Rio num show em Serra Talhada, que fica no sertão de Pernambuco. Às vezes brinco com os amigos quando me perguntam aonde vai ser o show que eu vou fazer e eu respondo que vai ser na Europa. Qual a cidade? Petrolina, eu respondo. Petrolina? E eu falo que o tempo da viagem de ônibus é até maior do que o tempo da viagem de avião para a Europa. De Recife para Lisboa, que é por onde entramos em todas as turnês, são 7 horas de viagem. Ao chegarmos lá, pegamos outra aeronave e levamos umas 2 horas para chegar a Paris, que é o nosso QG, pois o produtor europeu mora lá.

Esse show no sertão Pernambucano seria numa área de vaquejada, e seriam 3 atrações no palco. Netinho (o da Bahia) abriria a noite, depois seria André Rio e por final uma banda de forró estilizado chamada Cheiro de Menina, que eu não me lembro de onde era. Chegamos ao hotel perto das 11 horas da manhã, e fomos para os quartos deixar as coisas e esperar para saber o horário do nosso sound check. Foi quando o nosso produtor chegou no meu quarto triplo (monitor, PA e roadie e/ou iluminador – gostamos de ficar sempre juntos) e nos informou que a técnica de Netinho chegaria às 15h no palco para fazer o sound check e que não seria possível desmontar nada deles para o nosso sound check, pois ele seria a primeira atração. Como sou só um simples operador de áudio, quem sou eu pra dizer que estava errado, mesmo estando!!!

O certo, e o que normalmente se faz num evento “organizado”, são as bandas fazerem o sound check inversamente ao horário de apresentação, ou seja, o primeiro a se apresentar na noite é o último a fazer o sound check, pois deixa tudo montado esperando só pela hora da apresentação. Por essa lógica, quem deveria passar primeiro era a banda de forró, depois nosso artista e por final Netinho. Mas não teve acordo. A solução encontrada foi chegarmos de 13h para montar os equipamentos e fazer um sound check “rapidinho”. Venhamos e convenhamos... Uma rapidinha é melhor do que nada, não acham? E foi isso que decidimos.

Saímos para almoçar perto do meio-dia e depois corremos para o palco. Mais uma vez não fomos felizes, pois por falta de comunicação entre a produção do evento e os técnicos da empresa de som, estes só chegaram ao palco depois das 13h. Já havíamos até começado a passar os nossos cabos dos fones, pois toda a banda usaria fone e André usaria um in-ear sem fio. Foi quando um dos técnicos da empresa de som nos alertou que iria mudar de lugar os praticáveis (tablados usados para elevar alguns músicos), pois o desenho de palco de Netinho era completamente diferente do que estava montado. Eles mudaram tudo de lugar seguindo o mapa de palco de Netinho (documento enviado antecipadamente, aonde consta o desenho com as posições dos músicos e equipamentos no palco) e foi aí que notei que nós não teríamos tempo para fazer o nosso sound check.

Foi nessa hora que comecei a perder a virgindade!

Detalhe da mesa de monitor. O lugar era meio apertadinho.

Eu já sabia que a mesa neste evento seria uma digital, e por isso criei no meu laptop uma sessão (aprendi um dia com Fabrício, que já foi o operador de P.A. de Skank durante anos, que era muito melhor salvar uma sessão do que uma cena) do meu show antecipadamente em casa seguindo o input list do meu artista. Possuo um programa que pegamos de graça no site do fabricante desta mesa. Era só abrir esta sessão e sincronizar com a mesa na minha hora do sound check e fazer os ajustes. Até aí, tudo bem, pois já fiz isso várias vezes. Mas nesse caso não faríamos o sound check!

Para ganhar tempo na hora do nosso show, achei melhor fazer os ajustes partindo da cena de Netinho que o operador dele trouxe num pendrive e passou pra mesa, aproveitando ao máximo os ajustes já feitos por ele em alguns canais e evitando que houvesse muita troca na ligação dos instrumentos e vozes na hora de nosso show. Esperei o pessoal de Netinho ligar tudo e começar o sound check. E quando nosso ônibus chegou para nos levar para jantar (isso já era quase 6 da noite), salvei a cena dele no meu laptop como uma sessão e levei-o comigo. Jantamos e fomos para hotel. Enquanto o meu operador de P.A. e o roadie davam um cochilo, liguei meu brinquedinho e comecei a fazer os ajustes para o meu show. Montei o meu input de acordo com o input dele. Coloquei os instrumentos em comum nos mesmos canais. Por exemplo: coloquei o meu bumbo, caixa, esteira, hihat, tom1, tom3, over L e R (pratos da bateria), baixo, teclados e vocais nos mesmos canais dele. Isso faria com que não houvesse trocas de ligações nestes canais. Se eu seguisse meu input list, só iriam coincidir 5 canais nos mesmos lugares.


Tela do meu laptop com algumas das janelas do programa que utilizo para controlar as mesas digitais da Yamaha.



No canal da guitarra dele, coloquei um dos meus violões, pois não usaríamos guitarra. E o restante dos meus canais fui distribuindo nos canais mais parecidos, como meus instrumentos de percussão nos canais de percussão dele, mesmo não sendo instrumentos iguais, mas ficariam na mesma posição no palco, e seria mais fácil ligar as coisas pois os cabos já estariam no local. Estas mudanças foram anotadas num papel que entreguei ao técnico da empresa de som. Então ele sabia que o surdão e o timbale de Netinho seriam agora minha zabumba e meu pandeiro respectivamente. Essa distribuição dos instrumentos em canais semelhantes fez surgir vários espaços “em branco” entre alguns canais na minha mesa e na mesa do meu amigo que faria o som do P.A.. Mas isso também iria ajudá-lo, pois ele já pegaria vários canais já com um som legal pra começar o show, pois eram os mesmos instrumentos. Com os canais todos distribuídos, passei para a fase da equalização, corrigindo algumas coisas. Sei que não preciso, por exemplo, do grave do surdão na minha zabumba, então fiz os ajustes. E fui fazendo isso em todos os canais que via (todos os ajustes eram feitos visualmente) que os timbres eram totalmente diferentes. Modifiquei também as vias de monitor e estas mudanças eu passei para meu roadie. Falei que a primeira coisa que ele faria na nossa hora era ligar e distribuir as vias para nossos músicos. E foi isso que ele fez.

Já tínhamos deixado o microfone sem fio do meu artista ligado num canal da mesa que não seria usado por Netinho. E fiz todos os ajustes neste canal, inclusive colocando um efeito de ambiência (reverb) que o cantor gosta. Repito que todos esses ajustes foram “no olho”, eu não ouvia nada, mas com o tempo já sabemos o que acontece quando mudamos certos parâmetros e na hora a gente faz os ajustes finos. Depois de tudo organizado, salvei minha sessão, fechei meu laptop, tomei meu banho, e deu pra dar um cochilo de uns 15 minutos.

Fomos para o show.






Sound check de Netinho.







Tinha combinado com meu roadie Urêia, que enquanto ele ligava as vias, eu sincronizaria meu laptop com a mesa e escutaria se a voz do meu cantor já estava no in-ear dele com o efeito como eu havia ajustado no hotel. Não chegou no primeiro minuto e até passou pela minha cabeça um certo pensamento de desespero, pois se nem chegou a primeira coisa que eu achava que chegaria sem problemas, imaginei como seria com o resto dos canais. Respirei profundamente, pedi calma pra mim mesmo, e fui atrás do erro. Achei-o!

Sempre salvo a sessão com todos os canais fechados, pois aprendi na prática que salvando eles abertos é um grande erro. Quando sincronizo meu laptop com a mesa é exatamente na hora em que os técnicos da empresa de som estão refazendo as ligações dos cabos (desplugando e plugando em outro local), e se os canais estiverem abertos é “pipoco” pra todo lado!

Por isso nas minhas sessões eles estão todos off (desligados) na página principal da mesa, mas abertos no envio para todas as vias. Meu erro foi aí. Estava na página da mandada do sinal para as vias e todos os canais estavam abertos, mas como estavam fechados na página principal, o som não chegava ao in-ear. Foi só eu mudar a página (em mesas digitais se fala muito esta palavra) e ligar o canal da voz que ela surgiu no meu fone, linda, maravilhosa e com o efeito! Tudo como eu havia planejado.

Agora sim. Perdi finalmente minha virgindade! Nunca tinha feito um monitor só de olho.

Todos os canais chegaram aonde eram pra chegar e com uma sonoridade já legal. Precisei apenas ajustar o ganho de alguns e modificar um pouco a equalização de uns 3 canais.

Não sei em quanto tempo fizemos isso, pois não pensava em outra coisa a não ser no monitor. Mas lembro-me que não chegou ninguém ao meu lado pra falar que não dava mais para esperar e tinha que começar de todo jeito.

O show começou normalmente, como se nada tivesse acontecido. E tudo correu bem durante todo o tempo. Nem o cantor solicitou nada no seu in-ear. Não sabe ele que fui fazendo ajustes finos enquanto ele cantava, aumentando ou baixando instrumentos enquanto eu escutava o que ele estava escutando!

Ah! Esqueci de falar que o meu roadie ficou do outro lado do palco com um microfone para se comunicar comigo. Na realidade, este microfone seria usado por um dos músicos para se comunicar internamente com os outros músicos, mas achamos mais vantajoso deixá-lo com o roadie. Quando ele levantava a mão, eu colocava o som do seu microfone no meu fone e ele fazia os pedidos de ajustes que os músicos solicitavam durante o show pra ele, sem precisar se deslocar até a minha mesa.

Ganhamos muita rapidez com essa comunicação. Não é invenção minha. Ela é usada em muitos shows por aí já faz um tempinho.

Um monitor de um show hoje em dia não é feito só usando os ouvidos. A visão também é muito importante e este caso do laptop no hotel é uma prova disso. Com o tempo, aprendemos até a entender o que os músicos estão querendo durante o show pela leitura labial!

Até a próxima.

Um abraço a todos.

PS: Na noite anterior deu tão pouca gente, que as pessoas trouxeram as mesas que ficavam lá no fundo depois da mesa de som e colocaram na frente do palco. Viram os shows sentados e tomando uns drinks. Deve ter sido meio constrangedor para os artistas que se apresentaram, mas não deixa de ser uma imagem curiosa e que eu nunca tinha visto.

2 comentários:

Anônimo disse...

Como diz um amigo..."meuuuuuuuuuu irmãooooooooooooooooooooooo"!

Anônimo disse...

é muito complicado quando dependemos dos outros!
...dá aquele frio na barriga!
abraços