terça-feira, 17 de maio de 2022

Show de Elba Ramalho & Luã no Teatro RioMar - A mesa digital jogou um balde de água fria na minha comemoração.

Olá pessoal.
Dizem que nunca é bom comemorar antes do final, mas eu não tenho essas superstições, mesmo eu me lascando de vez em quando.
Mário Jorge, técnico de Elba Ramalho desde o tempo em que "Dercy Gonçalves era Paquita", me chamou mais uma vez para substituí-lo em dois shows da cantora que ele não iria poder fazer.
Adorei essa frase de Dercy, que eu vi hoje num grupo de áudio, usada para ilustrar como um colega nosso era antigo na profissão, e aproveitei para ilustrar como faz tempo que Mário opera o som dos shows de Elba Ramalho.
Esse show aconteceu no Teatro RioMar de Recife.
Mário me passou o rider técnico desse show, que seria sem percussão, e combinamos tudo certinho com Monteiro, colega nosso que responde pela parte técnica de lá.
Ficou tudo acertado. 
Eu já sabia que seria uma CL5 no PA, e uma PM5D no monitor. Ambas da Yamaha.
Montei uma cena inicial em casa, usando o editor offline da CL, com o input que Mário me enviou.
Já adiantei o serviço. 
Sempre faço isso, mesmo começando o soundcheck do zero, como seria nesse show. 
Já coloco os nomes nos canais, ligo o filtro de graves onde sei que vou usar, escolho os efeitos etc.
Cheguei cedo no teatro, para arrumar minhas coisas.
Eu sabia que o sistema de som do teatro tinha mudado, por alguma questão contratual.
O anterior era bem melhor, diga-se de passagem...
Acredito que a mesa de PA também fazia parte do setup que foi mudado, pois nunca tinha ouvido falar de problemas no teatro anteriormente.
Passei minha cena inicial para a mesa de som, e Monteiro fez todos os ajustes nas saídas, que iam para o PA, subgraves, front, balcão etc.
Tudo certinho.


Mas quando fui equalizar o PA, usando os faders do centro da mesa para controlar o equalizador gráfico, notei que alguns estavam com defeito, subindo e baixando sozinhos.
Normalmente, usamos esses faders centrais como sendo os masters das saídas: Auxiliares, matrix, DCAs(!!).
Não podemos chamar DCA de saída, mas geralmente controlamos os DCAs nesses faders centrais.
Já estava desconfiado dos faders da mesa... E quando fui "lincar" (vem do termo LINK - fazer um PAR) alguns canais, notei que um dos faders do par ficava louco quando eu tentava subir ou baixar o par.
Isso aconteceu quando fui passar o som das bases gravadas que seriam usadas em algumas músicas.
Simplesmente eu não conseguia movimentar o par de faders sem um deles ficar descendo e subindo todo tempo, fazendo com que o som aumentasse e baixasse.
Testei nos faders da guitarra, que são lincados também, e aconteceu a mesma coisa.
Não teve jeito e "deslinquei" todos os canais que eu iria usar.
Daria mais trabalho, pois eu ia ter que equalizar, comprimir, ajustar ganho etc, nos dois canais independentes, mesmo fazendo parte do mesmo instrumento.
Mas não tinha saída. Tinha que ser assim.
Até tinha outro jeito, criar grupos para esses canais, mas nem pensei em fazer isso.
E foi nesse momento que resolvi usar meu iPad sincronizado com a mesa, para poder mexer nos ajustes, sem ter que usar alguns faders da mesa.
Outra coisa que decidi, foi eliminar os faders do centro, deixando eles sem função, e coloquei os controles dos DCAs no bloco de oito faders no final da mesa, onde eu notei que não estavam com problemas.
Perfeito. Iria diminuir muito os riscos.
Consegui passar o som da bateria com Tostão Queiroga, pois ele era o único músico que estava em Recife. O restante da banda chegaria mais tarde, e daria tempo suficiente para fazer o soundcheck.
A gente não estava contando com o incêndio que teve nas palafitas no bairro do Pina.
Caos total no trânsito ao redor do local, que era bem perto do Teatro RioMar.
Resumindo... 
O restante da banda, chegou bastante atrasada!
Enquanto Flávio Rego, técnico de monitor, ia passando com a banda no palco, onde todos usam fones, eu ia subindo os faders lá na frente, ajustando a equalização dos canais.
Já estava bem perto do horário de abertura da casa.
Não tínhamos tempo para fazer um soundcheck normal.
Quando ficou razoável no monitor, acabou o soundcheck, independente de eu achar qualquer coisa.
Foi na correria mesmo.
Não deu tempo nem de ver os vocais.
E com o público já entrando na casa, pedi para o roadie dar uma dedilhada no violão de Elba, só para eu saber como iria soar no PA.
E foi só.
Agora, só restava aguardar pela hora do show.


Flávio ainda veio na mesa do PA pra falar comigo, mas nem lembro qual era o assunto. Lembro de ter pedido para ele falar com Luã, filho de Elba, que iria participar do show, para se possível, aumentar um pouco a emissão de voz, pois tive que puxar muito na frente.
O recado deu resultado, pois na hora dele, a voz chegou muito melhor.
Eu já tinha duplicado o canal da voz dele na mesa, caso precisasse de mais sinal de voz.
Vai começar o show...
Como não passei nada dos vocais, ajustei "no olho" os dois canais, baixei pela metade o DCA que controlava o volume desses canais, e durante o show fui levantando o DCA, fazendo os ajustes necessários.
Funcionou lindamente.
Elba começou a cantar e não tive problema em colocar a voz dela na base.
Lembrando que não passamos quase nada da banda com Elba. 
Passamos mais com Luã, do que com ela.
Tudo estava lindo durante o show.
Não lembro agora se o fato aconteceu antes ou depois da participação de Luã.
Também, não muda nada saber disso.
Sei que Elba estava cantando uma música de Belchior.
Se baixou para cantar e falar com as pessoas na primeira fileira de cadeiras.
Um pouco antes dela fazer isso, eu vou explicar um detalhe.
Lembram que eu falei que tinha desabilitado os faders do centro, né?
Pois bem...

Um pouco antes dela se abaixar na ponta do palco, eu chamei os DCAs nos faders do centro. É tão comum a gente usar eles para isso que foi algo automático.
Mas do mesmo jeito que chamei rápido, saí rapidamente, pois esses comandos de DCAs estavam no final da mesa.
Voltei minha visão para Elba, achando que ela estava conversando com as pessoas, pois não estava mais escutando a voz dela.
E parecia mesmo que ela estava conversando, mas quando vi o microfone perto da boca dela, tomei o susto!
Ela estava cantando!!!!
Parou o microfone!!! Pensei na hora! Fiquei tentando me comunicar com o palco para trocarem o microfone pelo reserva.
E quem disse que tinha "intercom" (intercomunicador) para falar direto com Flávio?
Falei ainda no meu rádio, que sempre levo já pensando na falta de intercom, mas nada do roadie me escutar. E eu levantando os braços na mesa...
Foi aí que olhei para minha mesa, ainda tentando entender o que estava acontecendo, e notei que o canal da voz dela estava modulando. Ou seja... O microfone não estava parado. Estava funcionando.
Por isso ela não notou nada no palco. Estava normal para eles, todos escutando a voz dela.
O problema era comigo!!!
Ainda sob o efeito do susto, saí à procura do problema, e fui eliminando as causas.
O fader do canal dela estava levantado? Sim, ok.
O canal estava endereçado para o LR? Sim, ok.
O DCA!!!!!!! Só podia ser.

Puxei o DCA nos faders do centro. Nem lembrei que tinha eles no final da mesa.
O fader do DCA responsável pelos dois canais de voz de Elba estava completamente abaixado!!!!!
Ele baixou (e eu não vi) na hora que chamei por engano aqueles faders.
Fui levantar o fader, e ele não subia de jeito nenhum!!!
Travado embaixo.
Tentei umas três vezes subir ele, e nada! Quase arranco ele na mão.
Foi aí que lembrei que tinha colocado esses mesmos controles no final da mesa.
Olhei para o lado, e estava lá o fader embaixo também, pois ele é uma cópia desse que eu estava tentando levantar.
E pelo que sei, não adiantaria eu ir lá no outro bloco e levantar o fader, porque como ele é uma cópia do outro, se o outro não sai do lugar, esse também não sai.
Eu tinha que sair primeiro dessa página dos faders centrais com os DCAs, pois assim não estaria mais com dois faders com a função do DCA7.
O público já estava tentando avisar que não tinha voz, e Flávio também avisou pra ela pelo microfone dele, que ela escuta, pois ele faz vocal também durante o show.
Foi quando subi o DCA7 no outro bloco, e surgiu a voz de Elba falando: --- Como? Parou a voz na frente? 
E o público respondeu: --- Voltou, voltou!!!!
Isso a banda já tinha parado de tocar. 
E Elba continuou falando, agora olhando para mim, logicamente: --- O que foi que houve? Parou a voz aí na frente? Qual foi o problema?
Com uma "cara de bunda", (nem sei de onde vem esse termo) apontei para a mesa.
E ela continuou: É... Mas é você que está operando, né?
Vou dizer o que? Nada.
Tempo que durou a agonia? 60 segundos.
Parece pouco, mas num show onde aparece um problema, é uma eternidade!!!!


Lembrei do outro caso que aconteceu comigo em 2005 com Silvério Pessoa na Bélgica, onde um equipamento perdeu o sincronismo com a mesa de som, e perdi 8 canais no início do show, onde um deles era a voz. Parou o show também, com todos ouvindo tudo perfeitamente no palco.
Esse na Europa foi mais complicado, pois os técnicos Belgas tiveram que fazer o sincronismo novamente dos equipamentos.
Tudo bem...
Fazendo as contas, comecei em 1987 a operar som ao vivo, e só duas vezes eu passei por isso, num intervalo de 17 anos (2005-2022).
Mas... Não é nada legal passar por isso.
Eu poderia ter resolvido esse problema com Elba em menos tempo??
Poderia sim, se eu tivesse visto o fader baixar. Não tinha a menor ideia que isso poderia ter acontecido.
Descobri por eliminação.
Quando descobri onde estava o problema, poderia ter resolvido mais rápido?
Poderia. Era só tirar a voz do DCA7, desmarcando a opção na página do canal.
Fazendo isso, ele não estaria mais vinculado ao DCA que estava com o fader totalmente zerado, e a voz apareceria normalmente.
Mas no desespero, esquecemos por alguns instantes de detalhes que podem ajudar.
Lembrei disso quando levantei o fader do DCA7.
Talvez nem teriam parado o show, por eu ganhar uns 20 segundos, mas se duvidar, ficaria pior o resultado, ficando a música com um buraco no meio sem voz.
Ela cantou novamente a música de Belchior do começo, e seguimos com o show, sem mais nenhuma surpresa, e eu ainda gostando muito do som., mesmo me recuperando ainda do susto!

Ahhhh... Não tirei a voz do DCA7. Foi assim até o final, mas sem eu tocar nos faders centrais!!!!!!
Usando os faders do outro bloco, mais o Ipad.
Realmente, foi um balde de água fria na minha comemoração.
Já vinha comemorando durante o show, antes de acontecer o problema na mesa de som.
Mas não deixei de comemorar o resultado geral.
No final do show, Monteiro veio falar comigo, e prometeu que não iria mais fazer eventos no teatro com essa CL5 que me deu a rasteira. Espero que ele tenha cumprido com a promessa, evitando que outros colegas e amigos de profissão passem pelo que eu passei.
Se ainda vou comemorar antes do final do show? Não parei para pensar nisso.
Cabeça-dura como sou, e que não liga para superstições, tenho quase certeza que continuo comemorando, mesmo sem o show terminar.
Como faço desde 1987!
Faz parte.

E nada como o que aconteceu no show de Renato Bandeira, que fiz nessa sexta-feira 13, operando o som do PA, para comprovar meus pensamentos.
Mas... Mais uma vez vou falar que isso já é uma outra história...
Um abraço a todos.

PS: Com essa correria que foi o show, vocês não queriam que eu tivesse tirado fotos, né? Só tirei uma, que é a que está no início do texto, e foi tirada enquanto eu aguardava o resto da banda!
Todos os vídeos, exceto esse último, foram feitos por minha amiga Mevinha Queiroga.

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